sexta-feira, julho 21, 2006

Kevin Spacey fala sobre a arte de ser vilão

Kevin Spacey em Superman - O Retorno

SÃO PAULO - Kevin Spacey estava visivelmente irritado durante a entrevista coletiva de Superman - O Retorno, na capital mexicana. Ele não devia estar nem um pouco satisfeito com as perguntas. Foi irônico até o limite do deboche. Nas mesas-redondas, com pequenos grupos de jornalistas, revelou-se outra pessoa. O antipático da manhã virou o Sr. Simpatia da tarde. Superman - O Retorno é muito bom e no Brasil estreou arrebentando - somente no primeiro fim de semana, de sexta-feira a domingo passados, fez 609.745 espectadores em 468 salas de todo o País. Mesmo assim, muitos espectadores reclamam da falta de carisma de Brandon Routh, que faz o herói, não reconhecendo que isso é fundamental para a abordagem que o diretor Bryan Singer faz do personagem. Carisma não falta ao vilão Lex Luthor, interpretado por Spacey.

Ele não revela quanto ganhou, mas admite que foi suficiente "para tocar outros projetos pessoais". Não trabalhou somente pelo alto salário, claro - "Bryan é um amigo. Foi graças a ele que recebi meu primeiro Oscar (o de coadjuvante, por Os Suspeitos, em 1995). Dez anos depois, Bryan continua determinado. Ele sabe o que quer e consegue persuadir todo mundo a trabalhar dentro de suas expectativas e necessidades. Tenho imenso respeito por sua criatividade." Como foi sua reação quando Singer lhe propôs o vilão, não um vilão qualquer, mas Lex Luthor. "Não escolho personagens pensando se são heróis ou vilão. Espero que sejam complexos e fascinantes. Lex Luthor consegue ser as duas coisas. Se Superman é o ícone do herói, Lex é o retrato acabado do vilão."

Como é estar num filme com tanto dinheiro? "Você tem que dar duro igual e não existe essa coisa do ´dinheiro que chegue´. Um diretor, do mais modesto ao mais perdulário, sempre precisa de orçamento para criar. Determinados filmes precisam mais." Spacey sabe do que está falando. Ele dirigiu um filme que está sendo lançado em DVD no Brasil. Tem muito orgulho de Uma Vida sem Limites, lançamento da Focus, que conta a vida trágica do cantor Bobby Darin, ex-marido da lendária Sandra Dee. Spacey engatinhava (nasceu em 1959), quando Darin fazia sucesso na música e no cinema. "Bobby tinha febre reumática e viveu sempre confrontado com a morte. Quando criança, os médicos diziam que não ultrapassaria 15 anos. No auge da fama, largou tudo para morar num trailer. É uma boa oportunidade para se discutir vida, morte e o que é importante para as pessoas.

O próprio Spacey, que faz o papel, canta Beyond the Sea (ele já havia cantado em À Meia-Noite no Jardim do Bem e do Mal, de Clint Eastwood). O clima é tão franco que o grupo de jornalistas pode abordar um assunto que seria polêmico numa mesa mais hostil - quando Spacey é bom, ele é ótimo, quando é ruim, é péssimo. "Sou, fundamentalmente, um ator de teatro. Minha experiência, minha técnica, tudo vem do palco. No cinema, você filma várias vezes o mesmo plano. Entendo que o sentido do meu trabalho é oferecer alternativas para o diretor usar na montagem. Há sempre pequenos gestos e inflexões de voz que introduzem um certo grau de mudança de um plano para outro. Um diretor inteligente como Bryan sabe tirar proveito disso e utilizar as melhores cenas. Outros não têm a menor idéia do que fazer ou selecionar."

Sua percepção dos diretores mudou depois que ele fez seu filme? "Mudou, claro, mas eu não posso querer bancar o diretor num set em que fui contratado somente para atuar." Como foi o reencontro com Kate Bosworth, que faz Lois Lane? "Kate foi maravilhosa em Uma Vida sem Limites. Indiquei-a ao Bryan e fiquei muito feliz quando ele a contratou. Sabia que seria uma ótima Lois." Não poupa elogios a Parker Posey, que faz a amante de Luthor, Kitty. "É muito divertida e talentosa." Toparia fazer Superman 2, 3...? "Se o diretor for Bryan e eu puder conciliar o cronograma das filmagens com minha agenda de teatro, por que não?" Kevin Spacey exerce atualmente a direção artística do Old Vic Theatre, de Londres. Acaba de fazer Ricardo II, com direção de Trevor Nunn; estréia em setembro nova peça, A Moon for the Misgebotten. Não se surpreende quando o repórter lhe diz que, em São Paulo, outro Ricardo, o III, ocupa o palco em duas montagens da tragédia de Shakespeare. "A peça é muito rica, tanto do ponto de vista dramatúrgico quanto do humano e do político. Ricardo III, com sua sede destrutiva de poder, fala muito ao espectador de hoje."

Fonte: Estadão

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